Caminhando e chorando e seguindo em vão
[#90] Um dia desses, ou melhor, uma noite, surtei enquanto caminhava por aí. Eu tinha duas horas livres entre um compromisso e outro. Não fazia sentido ir para casa e voltar, pois seria o mesmo que descer do ônibus, dar uma pirueta, atravessar a rua e pegar o mesmo ônibus no sentido contrário (sim, isso demora duas horas). Então, fiquei vagando pelas ruas, morrendo de medo, com o cu na mão porque a noite no Inferno não é nada segura. Eu estava perto de uma praça, mas a praça é tão escura à noite que não ouso nem dar uma volta ao seu redor (até porque já fui assaltada por ali). Caminhando pelas ruelas, me deprimindo a cada passo e percebendo que esta maldita cidade não tem NADA para acolher uma pessoa, comecei a chorar. Também a chuva apareceu, como se eu merecesse um castigo por existir. Aí me dei conta de que é foda não ter um banco para sentar, não ter uma parada de ônibus que seja coberta para escapar da chuva, não ter um espaço decente que protegesse do frio. Nem um banheiro público! Pensei que, apesar de tudo, mesmo naquela situação moribunda, eu não me igualava a um mendigo. Os mendigos passam por essa falta de acolhimento urbana o tempo todo, e eu mal agüentei ficar duas horas sozinha, sem ter o que fazer e debaixo de chuva. Ou você paga para estar dentro de algum lugar, ou você fica em casa. Mas quando não se tem dinheiro para gastar (ou, simplesmente, não se quer gastar), e quando não faz sentido ir para casa porque se mora muito longe, a solução é justamente essa. Morar no Inferno custa caro, essa é a verdade. Então fiquei lá, dando voltas sem rumo, chorando, afundando no pesadelo de estar sozinha e sem me sentir à vontade em lugar algum. É o Inferno, é o Inferno.